I
não
pontues nenhuma frase
que
se dane a respiração facilitada
vai
por onde o sol não possa iluminar os teus passos
e
torná-los mais previsíveis
o
universo é aleatório
porque
razão hás-de querer ser tu
maior
do que esta merda toda
afia
a tua faca
não
temas os cortes
não
os sutures ou escondas
do
policiamento do mundo
se estivesses
sozinho por um segundo
sem a
moral a acompanhar-te
confessa
quantos
crimes perfeitos cometerias
acredita
eu assumiria a co-autoria de tudo isso
e
provavelmente nem tu escapavas
por
que haverias de cá ficar
se o que todos queremos é
continentes novos
para
colonizar e edificar belas igrejas
rebentem
com tudo
queimem
as colheitas
menos
as do vinho do porto
porque
os ingleses gostam muito
e eu
gosto muito das canções deles
submarinos amarelos para
patrulhar primaveras estéreis
II
sei
lá o que digo ou faço
se
pelo menos rimasse
podia
dedicar isto a uma puta de telenovela
comprometer-me um bocado só para
experimentar
e
deixar Godot à espera
à
porta de um teatro devoluto
onde sobe ao palco um actor sem
papel atribuído
a
fingir de si mesmo e a chorar muito
como
um recém-nascido
como
um poeta
e os
poetas são todos um bocado maricas
por
isso que se foda a rima fixa
que
se foda a puta
que
se foda o compromisso
e o Godot se quiser que me
procure onde eu estiver
[destino
omisso]
ou
então que vá para o diabo que o carregue
a ele
e a todos nós
pesados de tanta filosofia que
trazemos partida
como
Fausto
vemos
Helena numa qualquer Margarida
até
ao dia em que acabarmos cegos
de
tanto julgarmos ter visto
e
nada termos de realmente nosso
para
além da incompreensão
de
todos os nossos passos
de
todos os textos e poemas
que
escrevemos embriagados
bebe
a vida até caíres
mistura
tudo
e se
te perguntarem no hospital
diz
que comeste uma ilusão estragada
podia reler este poema amanhã
e talvez até dar-lhe alguma
dignidade
mas a poesia quer-se assim
um bocado descomposta
para manter a pose pós-moderna
tenho olheiras permanentes
escrevo uns versos
bebo como gente grande
e ouço música alternativa
olha eu olha eu
sou um poeta avant-garde
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