um
navio passa suspenso sobre a linha do horizonte
levando
a bordo os meus sonhos de ontem
uns
por cima dos outros uns
ferindo os outros
e a acalmia
rodopia na praia como um cão inquieto
que
pressente no vento a melodia de uma matilha faminta
um
velho consulta as marés do relógio enquanto digere
um
tempo que já não é seu e que fala num outro idioma
que
já ninguém compreende em que já ninguém
vende
utopias
e cigarros desesperados por dedos mais firmes
que
os matem depois no cinzeiro rachado das crenças
porque
tudo isto é engano e desengano
tudo
isto é o orvalho de uma outra coisa qualquer
que a
chuva dos nossos dias deixa nas folhas dos olhos
e
sempre seremos isto
sombras
bruxuleantes que dançam descoordenadas com o corpo
e
nunca saberemos isto
por
vivermos eremiticamente na caverna que Platão avistou
nunca
saberemos coisa nenhuma
apenas
que um navio passa suspenso sobre a linha do horizonte
levando as nossas noites para uma manhã que as esqueça
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