uma ideia disforme que me vai sussurrando incessantemente
contra qualquer sono que me rapte nos seus braços de veludo.
as palavras que conheço e que já tantas vezes dispus
tentam assomar-se para relatar a ocorrência bizarra
de um motim no interior do homem a que se subordinam.
na verdade, esta ideia não me pertence
tal como eu não lhes pertenço.
a vida – é – assim – mesmo.
o rio corre para o mar que não conhece
não para a montanha que o pariu
e que ainda lhe lança um olhar altivo.
encontrámo-nos casualmente, bebemos uns copos a mais,
e agora estamos os dois às voltas na cama,
inquietos,
a debater-nos, a esventrar-nos,a procurar a essência orgásmica da poesia secreta dos colibris.
amanhã, quando acordarmos,
não saberemos muito bem o que fazer um com o outro
mas o mal já está feito – as palavras retrataram o nosso affair.amamo-nos hoje. negamo-nos amanhã.
a luz levará até as nossas sombras
e para trás ficarão, como postais, as nossas peles.
Ideia, ainda me consegues ouvir?
acho que bebemos um pouco de mais!...a vida – é – assim – mesmo;
mesmo – assim – a vida – é
um estúpido jogo de sentidos.
o homem leva as sementes e lança-as sobre os baldios,
tal como faz o poeta com as ideias e o barulho que despeja na fria mas cálida folha de papel.
se ao homem cabe colher o fruto e com ele saciar a fome,
ao poeta resta-lhe somente continuar a plantar ideias e febres
na ânsia de entreter e comover aqueles que o leem
nas horas em que o alimento não enche o cálice da existência.
Ideia, ainda me consegues ouvir?
fazemos mais um brinde à poética decadência?
[mas nem tu és poeta nem eu sou decadente!
sou uma ideia livre e não me tomes como tua!]
desculpa! se fosses mulher, os pudicos chamar-te-iam puta
com todo o respeito.
vamos dormir! é dia.
vamos dormir! é dia.
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