Páginas

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Fantasma de Pessoa, Saudades de Lisboa, Palavras à Proa

I

de que servem os versos neste país autista
que só sabe contemplar a genialidade paralítica de Pessoa
? contra ele nada mais tenho do que contra qualquer outra divindade,
porque eu nasci para Anti- Golias nesta pedante terra sem gigantes.

II

Amor, Liberdade e Poesia… onde estás tu Lisboa, Sonho [Nunca] Esquecido
? foste poetanol desinfectante nesta realidade fria, nesta terra não prometida,
estéril de vida, onde os dias pedantes se repetem no seu ritmo entorpecido
e onde os homens são somente insectos dados à experiência sempre sustida.

III

oh, as descobertas
! oh, os cancioneiros
! oh, a revolução decrépita
! oh, os banqueiros e os políticos polidos
! tudo isso me sabe a ranço
!

desta pátria nada herdo para além das palavras que lanço
como caravelas de papel afundadas num manso e lúgubre rio.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

poema de auto-análise

sou tudo aquilo que ainda não encontrei.
o que me dizem que sou, já fui, não mais,
porque todos os rótulossos se gastam
e tudo o que se gasta se regenera depois
nos instantes de criação de cada epílogo

dois a dois, é mais simples a caminhada,
mas eu sou dado aos voos rasantes,
sempre variando entre a ascensão e o declínio.
plano, sem planos, com asas de alumínio cortantes
de significados herdados que sustentam a fachada.
o mundo como pano de fundo: verde:
para fazer dele o que quiser, ainda que nada.

os meus olhos contêm a névoa exacta
da praia do teu regaço tranquilo e doce
que a brisa me promete pela manhã
quando acordo a tempo de me perder.

o meu cabelo ondulante, como um mar de inverno,
atribuem de resto ao meu rosto um ar não rastreado,
como um circo subalterno a ser desmontado,
onde um palhaço desmaquilhado procura por si
na jaula dos leões esfomeados e amestrados.

as minhas mãos são trémulas, pequenas e esguias
para agarrarem tudo aquilo que guardo dos sonhos,
por ventura desencontrados da concretude dos dias

não sei se é deste país ou se é de mim,
cidadão sem pátria e sem um deus medonho,
que provém a nostalgia que me impele
para o pátio do entorpecimento.

os meus pés levam-me sempre até a mim
e quando chego nunca me reconheço;
como a garrafa com a mensagem do naufrago
que as ondas sempre trazem, mas que nunca será lida.

os meus versos conduzem-me sempre a um rendez-vous
neste quarto de tecto baixo onde agora escrevinho,
onde a cama em que um dia estiveste me espera,
amarga, vaga, arrepiante como um ninho de espectros errantes.

a existência é isto. realidades e irrealidades.
o que é a loucura?
a vida é simplesmente a semente da procura.

quem sou? para onde vou?
pego nos meus pés outra vez. a vida vai-se em três tempos.
1, continuar, 2, nunca cessar, 3. Plim! Acabou…

“o meu nome é Pedro e sou o porteiro. quais são os teus pecados?”

pedra não fui! melhor encaminhares-me para o Hotel dos Danados.