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sábado, 7 de julho de 2012

depois do cinema













[como nos filmes,
vamos lá começar isto outra vez e apagar a culpa de engolir em seco.]

cadáveres computorizados, tóxicos como a inércia dos jardins camarários,
vagueiam pelos passeios sobrelotados de um passado triste – os vórtices,
os pontos de quebra de poemas industriais e prontos para uma explosão.

os nossos sinais vitais a serem rigorosamente monitorizados pela chuva,
pelo orvalho das árvores queimadas que perduram dentro de gastas veias.
palavras a sucederem-se, a atropelarem-se na fugacidade das intenções.

mais um copo de vinho para o vagabundo que teima em pedir esperança;
só mais um murro nos tomates da nossa mente que nos queima o mundo.
a lembrança, comboio turístico imóvel, com feridas de combate profundas

[como nos filmes,
vamos começar isto outra vez e limpar os olhos – revólveres velhos.]

lá longe, onde prantos de mágoa ecoam, existem fénixes que persistem,
existem sentidos novos para os nossos passos que deixámos de controlar.
sabemos que esse lugar ainda dista, mas os nossos sonhos podem tanto.

não podemos ficar apenas a contemplar o compasso mortal dos relógios,
as rotas que o fumo da fábrica vai traçando no céu, em nós, quando sós.
não pagámos bilhete para viver, mas queremos aplaudir a alguma coisa.

queremos comer pipocas, doces ou salgadas, assustar-nos naquela parte,
ter alguém ao lado a quem possamos estender o braço ao longo das costas,
a quem possamos explorar o corpo nos bancos cimeiros da sala de cinema

e, se no final de tudo isto, no caminho para casa,
concordarmos que o filme não foi grande merda,
podemos parar o carro, tirar a um pássaro uma asa,
voar e ir ver os robôs precipitarem-se em rios de xisto.

eles não serão motivo para a nossa eventual queda,
nem nós fomos a pedra em que já caíram mortos.



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