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segunda-feira, 6 de agosto de 2012

fogo-de-artifício, pudim, folclore e perlimpimpim




[metáfora da tarde e do esquecimento]

fogo-de-artifício de todas as cores nas nossas bocas,
incêndios a proliferarem nos nossos corpos molhados,
sôfregos, carnais, deitados em searas regadas a gasolina;
o trigo a abafar os nossos gemidos puros e recônditos.
animais ao longe sem bilhete a assistirem ao fim do dia
que se aniquila em suor na planície que nos domina.

não temos palavras. em casa,
temos um lembrete no frigorifico com os nossos nomes.
temos olhos abertos, aqui, agora,
cegos por qualquer coisa que não necessitamos de dizer.

[metáfora do lusco-fusco e do regresso]

um arrepio na pele. os nossos pés a tocarem as nuvens
e nós a sentarmo-nos, a pedirmos um desejo silencioso
que o vento leva para longe, para a casa banhada a prata
onde mora um gigante a quem disseram ser um monstro;
ele é feito de gelo, tem tentáculos dentre dele, ferros,
uma lâmpada, carne por comer e um motor quase mudo.

ele não sabe falar. na porta,
tem post-its amarelos com os nossos nomes caligrafados.
agora dorme. depois, lá,
quando chegarmos, sorrir-nos-á e terá um pudim para nós.

– Come rapaz! Senta-te aí fora, na soleira, olha as estrelas!
Pensa nela, ouve a festa e o folclore ali em baixo, na vila.
Dizem que este ano não há fogo-de-artifício…! – e fechou-se.

[metáfora da madrugada e do amanhecer]

e, agora, a noite de verão varrida por um vento que lembro;
e o silêncio que não corta, antes semeia pensamentos livres;
e as planícies que já não ardem, mas que libertam um fumo;
e os pirilampos luminosos, na vida e na morte, sem soberba;
e o pudim de ovos que não posso comer a saber-me tão mal;
e o fogo de artifício que não rebentou anunciado pela câmara.

mas nada disso torna os ponteiros do relógio mais estridentes,
pois escorrem estrelas cadentes que assobiam o teu rosto,
subtis, para o meu frigorifico não acordar e chamar por mim. 

Para a Filipa


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