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domingo, 24 de junho de 2012

equinócio


Fotografia: Eduardo Lima


o tempo varia.
mais um dia que passa,
sem nós e sem casa.

[um eco a romper os ventos e acelerar a sua urgência,
alguém debruçado na ponte a contar motivos
e a soltar a súplica metafísica que corta a ciência.]

talvez seja porque crescemos precocemente,
talvez seja porque quase me desvanecemos,
também demasiado cedo, com aquela aurora.
guardamos dias em que fomos astronautas,
em que fizemos desenhos com sóis a sorrir,
por vezes vários sóis num mesmo desenho;
guardamos aguarelas de cores que não temos.

[a pátria dos homens sem voz a tornar-se império
e os motores dos automóveis como melodias,
indiferentes à derrocada da poesia e do mistério.]

hoje somos mais velhos, sonhos em pedra,
sabemos bem o que é o sol, estrela amarela,
temos uma ideia da sua constituição: H + He.
no entanto, ao contrário de qualquer criança,
não possuímos o brilho no sorriso, nos olhos,
nas entranhas mais profundas do nosso ser.
nosso corpo contorce-se, se exposto ao calor.

[o náufrago conformado no arquipélago perdido
entregue ao seu próprio sarcasmo e ao sal
da água de um mar, onde jaz um deus vencido.]

horas presas em segundos passam lentas.
e ninguém nos poderá dizer quem somos, ou que fomos.
pessoas metidas em fotografias riem sempre.
são indiferentes à passagem dos dias,
que não trazem essa luz nova, essa prometida.
impomos na voz um tom frio e lunar. sorrimos.
cristalizamos. a distância entre nós é um universo inteiro.


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